domingo, 28 de abril de 2013

Desilusão

Desmantelo a minha imagem no espelho: essência no final do caminho, numa rota de conflitos e de convergências. Tudo até o fim foi ilusório como a luz verde da névoa da manhã de outono, coberta de gelo e de neblina. Eu estou novamente diante do dilema da existência, extasiado pela essência de um amor que me faz mal mas que já me fez bem. Que quero e que não quero ao mesmo tempo.

Escrevo com o tempo em meu coração. A ilusão das coisas naturais me observa e me contempla, e eu sou uma folha seca golpeada pelo vento. Estou ferido. Em meu peito eu sinto uma dor imensa e a incisão precisa de um diapasão. Contemplo a imensidão do horizonte azul num gesto de beber o céu. Lá estão as estações, o paraíso, um arco-íris de cores vivas e infinitas.

Desmantelo a minha imagem atrás do espelho: dúvida de qual caminho a percorrer. Natural seria correr como um riacho, deslizando calmo nos beiras da existência. Mas como o sê-lo? No interior da alma humana há uma quimera que só dói quando em amor. O amor e as suas mazelas. O amor e os seus inconjugados verbos. O amor e o seu maldito ensinamento. Eu contemplo a imensidão do horizonte azul e bebo o céu no meu olhar.


quarta-feira, 24 de abril de 2013

Um Olhar para o céu Noturno

Eu penso no espaço sideral. Olho para o céu e mergulho num mar de estrelas longitudinais enquanto na televisão o jornal nacional anuncia um reality-show em marte. Viagem só de ida. Viagem de colonização. Viagem na profana busca dos humanos por uma constelação de vaidades. Mas eu olho para o céu com um ar de arqueólogo. Numa imutável rotação o universo conspira ao meu favor.

De onde viemos? Eu penso que foi de algum lugar do espaço, no rastro de algum cometa destruído ou no centro de alguma nave espacial. Eu olho para o céu noturno e busco uma explicação para as minhas ancestrais vicissitudes. Na imensitude do cosmos se esconde o meu sorriso. Improviso um verbo em corda solta enquanto o silêncio do universo gira sobre mim como um pião.

Eu me sinto como uma peça de gamão sendo movida. Um peão num jogo de xadrez que é descartável. Incansável é o meu querer, infinita a minha vontade de saber, mas insignificante o meu sentido. O que somos? Para onde vamos? Existe alguém além de nós neste universo? Por certo que sim, mas enfim, sou apenas um poeta num insondável mistério de alma e de estrelas. O meu olhar se perde no fundo deste céu noturno. Soturno é o meu sentido, infinito é este momento. Eu só sei que nada sei. E Sócrates, revivido em mim por meus anseios primitivos, me contempla com um ar de professor. 




sexta-feira, 12 de abril de 2013

A Reconstrução do Poeta

O frio do fogo me aquece. Ao redor das chamas crepitantes eu conspiro com o universo e os meus anseios primitivos agem como que por instinto. Tateio a pedra que quebra o gelo, os meus dedos são longos servos do amor e do pecado, lascivos e ágeis, abstratos. Num cenário de sombra e de estrelas eu começo esta noite. Afoito é o meu coração. A razão das horas é o fermento da poesia.

Minha alegria é completa quando vislumbro a lua. Nua, deitada num espelho de prata. Na mata o silêncio noturno é inquieto como tudo o que o cerca. Um som de água corredeira. Extasiado estou e em comunhão. Toda a emoção que me sustenta desmaia em meus loucos pensamentos. Eu choro junto do vento por uma razão que nem mesmo eu sei.


O gelo da neve me aquece. Emoldurado na paisagem eu calmamente escrevo. Cada palavra celebra um novo feito, tardio, rarefeito. No espelho da minha alma eu me revejo, me reconheço, me alimento. Eu sou um servo dos segredos do universo, um novo e reluzente verso. Disperso eu estou em sentimentos, absorto, transbordante em rimas imperfeitas e em notas dissonantes.

 Eu me entrego aos sentidos. No improviso desta noite eu me visito, me refaço, me desfaço a cada assalto. Estou como o verso de um poema inacabado, abalado, pronto para a grande apoteose. Talvez sob o efeito de overdose, talvez desvendado na emoção, talvez seguindo apenas a voz do coração. Eu estou descalço, o gelo aquece e desata os meus sapatos.

Eu estou junto ao poema: em construção...

quarta-feira, 10 de abril de 2013

O Mar das Ilusões

Estou num monte de sal. O mar é um horizonte sob os meus olhos, e eu recolho o ensinamento de sua imensidão. Na razão das coisas naturais eu me recolho, me encontro, me proponho a caminhar. Estou como a navegar num rio de sonhos, absorvido por caminhos perigosos e recôncavos. Eu me alimento de sal, de ar e água. Nada mais é como foi.

Como a Nau que peregrina em sete mares eu me lanço ao oceano azul. Minha alma é o sul e o meu coração a furta cor de uma paisagem descolorida. Na vida as coisas são pueris e sem idade, e uma meia verdade é o que te guardo. Espaço do meu tempo que se foi. Razão do que eu não pude ser. Espelho do que colherei na frente. O mar é uma serpente helicoidal que me sufoca, mas eu surfo mesmo assim em suas ondas.

Estou num monte de sal. A cal não é para mim uma saída, nem mesmo uma atormentação. A inércia de meu coração congela os pés que me guiam e levam, e eu mergulho no verde tantra do oceano azul. Lá, bem no fundo, estou gelado. Imerso no fogo do amor e em seu cadafalso. Estou preso ao retrato dos dias do passado, mas desancorado. Estou levado, malogrado pela corrente do destino.

Eu estou à deriva em pleno outono.

segunda-feira, 8 de abril de 2013

A Canção do Exilado

Cada passo na estrada é um balaço. Refaço cada pedaço do caminho em meus pedaços, descalço numa estrada de tempo e comoção. A razão comanda o tino do meu coração e eu vou tateando com os pés num chão de giz. Olho para as pegadas e lembro do que fiz e do que sei, e sei que apenas um futuro me reserva: um tempo de quebra, de novos vôos e desafios. Cada passo da estrada é um balaço. É assim que eu refaço o meu poema.

Se a alma não é pequena tudo nos vale a pena. Parafraseio os versos de um poema de Pessoa para buscar nele onde se espalhou o céu, e do mar e do abismo eu ressurjo como a luz do dia. Minha alegria é sempre compartida, minha alma agora uma partida, e os meus anseios sempre um rio corrente. Estou à frente do meu tempo e do meu corpo, absorto em novos e loucos pensamentos. O poema que escorre dos meus dedos é só mais um desafio.

Arreios são os meus sonhos, anseios do sopro que me vem da alma. A palma da mão esconde os meus segredos revelados, mas o barco que partiu de longe ainda não chegou até mim. Então eu vou ficar aqui e até o fim da festa, à espera de um verso iluminado. Debruçado na janela eu vejo um lago e um céu de estrelas vespertinas brindando o sol que despenca, e uma noite madrugueira que já se preludia em mim. É de um lugar assim que preciso, para que eu possa ficar em paz mesmo comigo.

A madrugada será agora a minha Canção do Exílio..