sexta-feira, 23 de novembro de 2012

O Desalento e as Suas Consternações

Te compreendo. Tudo é desalento ao pé do tempo. Perdida estás de mim que não te encontras. Por onde andas? Eu sou um panda gigante à tua frente, que seria impossível me disfarçar. E os meus olhos de mar seriam algo de navios além do oceano. Engano meu seria não te notar. Onde estavas? Aqui é o teu lugar, junto de mim e do meu coração.

Estás perdida? A vida é um leva e traz de cochichos e arreios que vez por outra nos enredamos. Estamos ao pé do estribo, caminhos ajustados para o esquecimento. Mas que és tu? O que te fere? Qual a causa que te traz intimidade?

Eu sou o mesmo desde sempre. Não mudei nem um centímetro, e então, porque tu não me reconheces mais? Será tão difícil assim de me notar? Existem perguntas que não tem respostas, e tu sabes bem que é assim . Arredio tem sido o teu sorriso para mim, largo e impreciso como as folhas pelo chão. Já é outono?  Vejas que também estou perdido, enredado nas palavras de um verso sem refrão, arrancado do inverno da alma pelo teu bordão. Mas porque estás perdida, menina?

Eu te contemplo. Tudo é desalento ao pé do tempo.

segunda-feira, 19 de novembro de 2012

O Caçador de Tsunamis

Uma tsunami. A vida é uma onda que nos levanta, uma massa de água gigante que atinge o céu de cada um, levando a tudo e a todos adelante. Depois que ela passa, que se arranje a humanidade. A insanidade da sua força é a sua beleza, mesmo que trágica, mesmo que avassaladora. A vida é uma onda que arrebenta na praia da alma, que trucida e esmaga sonhos de roldão como um moedor de carne americano.

Eu vivo em meio a uma ilha assolada de tsunamis. Sei a hora e o dia em que elas chegam, mas nunca consigo me prevenir de sua força. Me perco e sempre bebo do sal das águas de um mar carregado e agitado, e assim incorporo a sua áurea. Navego em águas agitadas desde o dia em que me desvincilhei do meu velho corpo, e agora, como um louco eu me vejo, contemplando o precipício verdazul com os meus olhos de demência e insanidade.

Eu já não tenho a mocidade do meu lado. Minha cidade não me reconhece mais, e eu sou um barco sem timão a navegar por mares nunca dantes navegados. Eu sou um colecionador de tsunamis, um cruzador de alto bordo em solo imprevisível e abarbarado, perdido em meio a um mar aberto de tormentas e furacões. Eu quero surfar na crista da onda mais alta e arrebentar na praia paradisíaca do meu sonho, pois só assim eu poderei render-me a ti. Eu sou um caçador de tsunamis.

terça-feira, 13 de novembro de 2012

Noite de Vertigem

Vertiginosa é a noite em que estou sem o teu olhar. Teu sexo é seco como o ar e eu mergulho nele em busca dos meus prazeres. Se tu me queres, dizes para mim o que tu busca. Escuta da minha boca o que te dizem, não se deixe levar por zumbidos e gemidos que são, na verdade, um falso amor. Amor barato. Sexo pago em carrossel de ilusões. Eu te digo o que quiseres. Eu não escondo de ti os meus segredos, nem mesmo os piores. Deles tu conheces o seu âmago.

Amargor é o sabor da tua boca em noites como essa. Eu te possuo e tu és uma peça de artilharia francesa, uma metralhadora giratória que verte palavras pela boca. A lua nova saboreia teus sibilos, e o vento morno leva para longe os teus gemidos. Improviso movimentos circulares em busca do meu único prazer. Tu és nele o meu bem querer, mas em noites como essa eu te odeio. Não ponhas fora os meus sorrisos.

Que eu sou um homem triste em noites de intensa sedução e desafeita do teu toque e teu desejo. Eu me vejo em ti, espelhado, e te descarto. Eu estou casto, minha perna é curta para correr atrás da poeira louca dos sonhos infinitos, e foi por lá que eu te encontrei. Nada serei nesta noite em que estou em ti, triste, desiludido, controlado pelo impreciso verbo que me faz te naufragar. Eu quase não consigo me conter.

Vertiginosa é a noite em que estou sem teu olhar. Vertiginosa noite. Vertiginoso verbo. Vertigem louca de anseios. Eu sou um céu de estrelas madrugueiras nestas colinas que imitam os teus seios, pequenos cômoros de areia que cabem em meu maxilar. Eu mastigo os teus mamilos e penetro o teu sexo seco e quente que não demonstra me querer. Mesmo assim eu gozo em ti, dentro de ti. Só assim esta noite poderá terminar.

Eu vivo uma noite de vertigem. 

sexta-feira, 9 de novembro de 2012

Quando a alma se transforma

O que vejo? Diante dos meus olhos um rosto que esconde a mulher que eu desejo, mas que já não é mais o mesmo. Mais fino, contornado, traços alterados de forma quase imperceptível, mas ainda assim de uma beleza singular. A Inocência que se escondia nele se perdeu n´alguma linha invisível, contorcida  por entre os cílios e o maxilar. Eu busco te encontrar na nova face que se reconstrói num molde de arame e de alumínio.

Dos lábios grandes ecoa agora uma voz de portuguesa. De onde viestes esta faceta lusitana? Onde foi parar o teu ar brejeiro e tão comum, a forma doce de tu dizer que me amava? Tu estavas tão feliz que não pode haver tristeza agora. Não deveria. A luz que irradia dos teus olhos está difusa, confusa está a tua alma, emaranhada por conflitos e infinitos, rodeada de sombras e singelezas, de dúvidas e incertezas. Eu não te quero assim.

Olhe agora para mim: tu tens escolha. Escolta o teu desejo apoiada em meu sorriso, que assim será mais fácil prosseguir. Pois eu te quero como sempre quis, e não deixarei de lado o teu olhar. Mesmo que diante dos meus olhos esteja o mar, ou mesmo o ar de uma mulher que eu não conheço, alguém que numa nau de alumbramentos mergulhou e que agora acordou diferente, de um sonho grande, diante do espelho e perdida em uma nova e cotidiana vida.

A natureza é sábia em sua guarida, dá formas diferentes a todas as coisas e a todos os seres que lhe habitam, e a cada um deles atribui a sua única beleza. Cada ser é único em sua construção e belo pelas diferenças que impostas lhe são, agreste e selvagem em traços imperfeitos e incomuns. O homem é único por sua imperfeição, belo em seus erros e acertos, por seus defeitos e por sua formatação. Este talvez seja o grande segredo da existência.

Tu és agora um universo em mutação.

segunda-feira, 5 de novembro de 2012

Os Amantes da Noite

Nada é mais revelador neste mundo do que a razão do teu olhar. Nada se esconde nele, por trás dos teus olhos sedutores, nada. Nem mesmo a fada dos silêncios que te habita, nem mesmo a misteriosa energia que te conduz para a arrebentação do teu corpo, muito menos a falta mansa do teu estado nebuloso, a flauta doce em que tu esconde os teus segredos, ou mesmo o beijo que reservas para mim.

Ontem eu te amei assim, à beira de uma lagoa em movimento. Tu eras uma jovem moça em desatentos dessossegos, e o vento da noite morna esvoaçava os teus cabelos. A noite era de um cheiro de desejo, enluarada pela presença da lua e o seu exército de estrelas, entabulada pela silhueta das árvores e da paisagem escura do local em que estávamos. E tu mirava as estrelas.



Foi real o que fizemos. Dias e noites nós nos amamos em contante descoberta, tu sendo uma estrela, eu a noite que te guarda. Noites e dias assim nós dois vivemos, e viveremos para sempre. Hoje eu te venero, não mais como a uma deusa em sua beleza, nem como a uma rêmora selvagem, mas sim como a uma bela e real situação. Hoje eu te venero apenas pelo coração.

A fogueira que encantou a madrugada se desfez, mas as suas brasas ainda queimam no arrebol. Nada é mais revelador que o teu olhar quando me queima como um sol, que me busca e te sustenta, que desafia o meu olhar inquisidor. Nele eu vejo tudo o que procuras. Ontem eu te amei à beira de uma lagoa em movimento, e foi real o que fizemos. Tu estás viva. Eu estou vivo. O universo é um rio que corre em curso incerto.

Nós somos os amantes da noite, um do outro.