sexta-feira, 27 de julho de 2012

Tu me falas de um sonho, e eu me vejo nele. É estranho. É mais estranho porque nós nunca nos falamos, embora os nossos olhares sejam cúmplices de um luar noturno. Tudo é ferrolho e picumã. Vermelho como o sol que nasce de uma manhã de primavera. Como um caminho que irrompe à terra envolto em brumas. Tu vens por ele, mas não é a ti que eu procuro. Eu escuto o luto de uma voz antiga, de uma avó charrua. E o vermelho desta voz me incendeia, enredando-me numa teia de mistérios e de inquietações. É muito estranho, mais ainda porque nós nunca nos falamos. Mas a voz charrua sussura aos meus ouvidos: conta-me segredos, me fala da alma de um tempo, o tempo ancestral. Eu já estive lá. Você também. Somos peregrinos que já se cruzaram em seus caminhos. Somos o improviso no verso de um poema campesino, cúmplices de algo que ainda nem mesmo compreendemos. Um rítmo flamenco enfeita a prosa de dois loucos ao duo de castanholas que desafiam o mundo em caravelas. Tu me falas de um sonho, e eu me vejo nele.

Sim, pois eu acredito em sonhos. Acredito que eles nos falam da alma; Que eles nos mostram o que somos e o que queremos. Misteriosa é a alma humana e os seus desígnios, misteriosos são os caminhos pelos quais andamos; É engraçado: eu tenho falado com uma bugra charrua nestes dias, e há muitas vidas. Ela me fala de um tempo antigo, de um tempo ancestral; De um olhar perdido que ficou pelos retratos, e de uma história que eu ainda não consigo formular. Mas eu estive lá, e você também. Pois nós somos cúmplices de um poema não escrito.

Tu me falas de um sonho, e eu me lembro dele...

 







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