domingo, 9 de março de 2014

A MADRUGADA DOS POETAS

Eu atravesso a madrugada com o coração abarrotado. Estou calado, triste, reflexivo. Apenas de improviso eu respiro e me alimento. Sustento  a tese oral da felicidade, mas a verdade é que o meu coração está triste, assentido, amortecido pelo fardo do destino. Assino embaixo de tudo o que eu  te digo mas, e daí? O que me importa saber se o sol nasce no leste? A grande peste é este poema inacabado.

Malfadado verso, eu te prescrevo! Te solfejo e te rastejo, e limo, e te cortejo; Invento um verbo solto, um verso torto, um anagrama, tudo para ver-te pronto e tu, no entanto, insiste em não se poetizar. Eu tenho ganas de jogar-te ao mar, ao sal, à aridez do fogo do deserto e do desterro, mas eu te desejo mais que tudo. Neste paradoxo impuro eu vivo em constante amor e ódio.


Eu atravesso a madrugada amargurado, os olhos estalados, a boca seca. Penso na essência das coisas naturais, no sentido simplista da vida cotidiana, no arranjo coletivo de se viver. Tudo hoje me faz sofrer e querer ser algo além de mim, assim como um herói de revistas em quadrinhos ou um cometa sem destino vagando por uma rota indefinida. A vida é a linha-dura que mostra-me a sua face inconstruida.

Desatinado verbo, outra vez eu te esconjuro! E te conjugo, e te martelo, e te atropelo e te bendigo. Eu sou o mendigo de Victor Hugo louco para roubar-te e alimentar-me. Tu, no entanto, já não me estende a mão. O meu coração queima na insana razão de destrocar-te, mas eu te desejo mais que tudo. Neste dilema inculto eu permaneço inerte, insano, afogado no pranto desta imperfeição.

Eu atravesso a madrugada com dois punhais nas mãos...

Nenhum comentário:

Postar um comentário